Octávio Augusto Martins Lopes – Procurador de Justiça Junto à Procuradoria de Habeas Corpus
Resumo: Este estudo visa abordar a dificuldade de se formar entendimentos uniformes na jurisprudência acerca das alterações feitas no Código de Processo Penal afetas à prisão preventiva.
Como ingrediente extra para dificultar a vida dos operadores de direito, concomitantemente com a entrada em vigor da Lei nº 13.964/2019, tivemos o início da pandemia da Covid-19, mudando hábitos e costumes em todo o planeta, ao mesmo tempo.
Essa pandemia mudou não apenas a forma de viver do ser humano, mas, igualmente, a forma de entender o Direito, flexibilizando a aplicação da lei enquanto não cessada a pandemia.
A título de exemplo, no que concerne à prisão preventiva, a pandemia trouxe dificuldade na realização de audiências e de atos processuais, tornando difícil a missão dos magistrados em cumprir os prazos e finalizar a instrução criminal a tempo e modo. Em consequência desse fato extraordinário e passageiro, os tribunais mudaram o entendimento acerca do reconhecimento de excesso de prazo na prisão preventiva, ao argumento de que o atraso não poderia ser imputado ao judiciário, deixando de conceder a ordem em processos de habeas corpus em casos nos quais, comumente, o paciente receberia o alvará de soltura.
Lado outro, milhares de presos provisórios foram soltos, em casos de reconhecida gravidade, com o argumento de que correriam risco de serem infectados e mortos pela Covid-19 em ambiente prisional propício à disseminação do vírus. Nesses casos, o motivo determinante para a soltura foi a pandemia, ou seja, uma vez cessada, presos em situações idênticas não receberão o benefício da liberdade provisória.
Outro exemplo da interferência da Covid-19 na prisão preventiva está ligado diretamente a uma norma inserida no Código de Processo Penal pela Lei nº 13.964/2019, dizendo respeito à realização das audiências de custódia (artigo 310, do estatuto citado).
Conforme já mencionado, a pandemia trouxe enorme dificuldade na realização de atos processuais. Assim, os tribunais uniformizaram o entendimento de que o atraso na realização do ato ou mesmo a sua não realização não invalidaria a custódia cautelar, caracterizando mera irregularidade.
Indubitavelmente, a pandemia afetou, de forma avassaladora, a jurisprudência dos tribunais. Não nos é possível imaginar como seriam as decisões sobre a prisão preventiva, especificamente no que concerne às alterações promovidas pela Lei nº 13.964/2019, se não sofrêssemos a avalanche da Covid-19 em nossas vidas.
Este ano, a tendência é que seja declarada o fim da pandemia. No entanto, alguns posicionamentos sobre o denominado Pacote Anticrime começam a se consolidar, enquanto outros ainda estão em fase de maturação.
Se o início da pandemia afetou a jurisprudência pátria, o mesmo não se espera em seu fim. Pouco a pouco, a vida das pessoas volta ao normal, assim como a estabilidade jurisprudencial.
1 Introdução:
A Lei nº 13.964/2019 acaba de completar 02 anos, período no qual a jurisprudência vacilou e, ainda, continua vacilando na busca por posicionamentos que tragam uniformidade de posicionamento.
É comum operadores do direito, sobretudo juízes, desembargadores e ministros renderem-se a um posicionamento diverso do que vinham adotando.
E nessa toada, por algum tempo, creio eu, as decisões que envolverem a prisão preventiva, incluindo aquelas proferidas pelos tribunais superiores, provocadas pelo ingresso de habeas corpus, ainda sofrerão algumas mudanças, pois o processo reflexivo está em construção, demandando um período de maturação.
Cabe aos operadores do direito, sobretudo aos magistrados e promotores de justiça, ficarem atentos às sinalizações emitidas pelos tribunais, a fim de evitar o reconhecimento de nulidades da prisão cautelar, que poderá trazer ao retorno social presos com grau de periculosidade acentuado, sem estarem preparados para tanto, trazendo risco à ordem pública, pois os julgadores estão tateando o terreno, como se estivessem em uma areia movediça, em busca de um porto seguro, buscando evitar ofensa às garantias individuais ao mesmo tempo em que tentam preservar o interesse coletivo.
2 Principais Pontos Controversos
2.1 Prisão declarada de ofício: um dos temas que gerou vai e vem na jurisprudência parece ter encontrado uma tendência mais firme: trata-se da prisão preventiva decretada de ofício pelo magistrado.
Assim dispõe o artigo 311, do Código de Processo Penal: “Em qualquer fase da investigação policial ou do processo penal, caberá a prisão preventiva decretada pelo juiz, a requerimento do Ministério Público, do querelante ou do assistente, ou por representação da autoridade policial”.
Em uma primeira análise, a prisão preventiva somente poderá ser decretada mediante requerimento do Ministério Público, do querelante, do assistente ou da autoridade policial.
Todavia, ao meu sentir, há hipóteses em que é possível a decretação da prisão preventiva ainda que não haja requerimento das partes ou da autoridade policial.
A primeira exceção ocorre quando o juiz analisa o auto de prisão em flagrante, ocasião em que lhe é facultado relaxar a prisão, convertê-la em prisão preventiva ou conceder a liberdade provisória, com ou sem fiança, à luz do disposto no artigo 310, do Código de Processo Penal.
Referido dispositivo prevê a possibilidade de o magistrado, ao receber o auto de prisão em flagrante, converter a prisão em preventiva, se presentes os requisitos, sem dispor sobre a obrigatoriedade de prévia provocação do Ministério Público ou da autoridade policial ou mesmo de prévia intimação da defesa, pois a vedação prevista no artigo 311, do CPP, se refere à decretação da preventiva, de ofício, de indivíduo que se encontra solto e que figura como parte em investigação ou processo, não se aplicando aos casos de prisão em flagrante.
Cabe ressaltar que o juiz poderá decretar a prisão preventiva ainda que o promotor de justiça opine pela concessão do relaxamento da prisão ou pela liberdade provisória, pois o magistrado é livre na formação de seu convencimento, não se encontrando vinculado ao parecer ministerial.
De fato, parece-me fora de propósito exigir que o juiz seja obrigado a seguir o parecer ministerial quando este se encontre falho, em desacordo com a legislação pátria.
Entretanto, cabe reconhecer que há farta jurisprudência reconhecendo a nulidade da prisão preventiva decretada de ofício, ainda que nas circunstâncias acima mencionadas, como decisão proferida pelo Ministro Celso de Mello, ao conceder a liminar no HC nº 186.421 MC/SC.
No TJMG, ao contrário, predomina o entendimento – longe de ser unânime – de ser legal a conversão do flagrante em prisão preventiva, ainda que de ofício.
2.2 Distinguishing/Overruling: outro tema recorrente nos tribunais, em matéria de habeas corpus, após o advento da Lei nº 13.964/2019, versa sobre a necessidade de realização do distinguishing ou overruling quando a defesa citar julgados que favoreçam o paciente, conforme regra inserta no artigo 315, §2º, VI, do Código de Processo Penal, in verbis.
Art. 315. A decisão que decretar, substituir ou denegar a prisão preventiva será sempre motivada e fundamentada.
(…) §2º Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que:
(…) VI – deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento.
Com relação ao tema, cabe destacar que, em consulta à jurisprudência pátria, encontramos decisões conflitantes em casos muito similares, cabendo ao julgador escolher o caminho que considera justo para o caso concreto.
É de se imaginar: qual decisão deve proferir um magistrado quando encontrar na jurisprudência decisões conflitantes para caso similar? Obrigatoriamente, haveria descumprimento de precedente invocado por uma parte ou por outra, o que, convenhamos, é absurdo, inadmissível, inimaginável, vez que inviabilizaria a prestação jurisdicional.
Assim, a escolha por um caminho ou por outro não implica em ofensa à norma disposta no artigo 315, §2º, inciso VI, do Código de Processo Penal, desde que a decisão esteja devidamente fundamentada.
Ademais, somente se exige a realização do distinguishing ou overruling quando se tratar de precedentes dotados de algum caráter vinculante.
Nesse diapasão:
[…] 11. A eventual soltura ou substituição da prisão com base no exame técnico definido nos institutos distinguishing ou overruling reclama correlação com a situação especifica do caso em concreto, hipótese não verificada nos autos. Ademais, os precedentes a serem observados devem resultar de Repercussão Geral no Supremo Tribunal Federal ou Recurso Especial Repetitivo no Superior Tribunal de Justiça, Súmula Vinculante ou Comum, ou decisões com efeito erga omnes, cujo conteúdo possa se coadunar às peculiaridades do caso.[…] (AgRg no HC 643.905/SP, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 23/02/2021, DJe 01/03/2021, grifo nosso)
Assim, se a impetração fizer menção de julgados esparsos, embora semelhantes à situação concreta, podem ou não ser seguidos, de acordo com o livre convencimento motivado do magistrado.
2.3 Contemporaneidade: este é outro ponto que tem gerado discussões, previsto no artigo 315, § 1º, do Código de Processo Penal:
Art. 315. A decisão que decretar, substituir ou denegar a prisão preventiva será sempre motivada e fundamentada.
§ 1º Na motivação da decretação da prisão preventiva ou de qualquer outra cautelar, o juiz deverá indicar concretamente a existência de fatos novos ou contemporâneos que justifiquem a aplicação da medida adotada.
Nesse quesito, cabe ressaltar que o lapso temporal deve ser valorado como um dos parâmetros para a análise da contemporaneidade e não como critério único e objetivo.
De fato, se o intuito do legislador fosse impor o decurso do tempo como critério absoluto, por certo, teria formulado uma escala temporal objetiva e vinculativa do julgador.
Por essas razões, para aferir-se a contemporaneidade de um decreto de prisão, é necessária a análise concreta e individualizada do caso, ponderando-se o risco de reiteração, os crimes em debate, a estrutura criminosa e sua complexidade, as diligências e provas produzidas, além do tempo decorrido entre o evento criminoso narrado e a decisão.
A propósito, destaco pertinente lição do Ministro Edson Fachin sobre o tema:
[…] “aferição da atualidade do risco à ordem pública, como todos os vetores que compõem a necessidade de imposição da prisão preventiva, exige apreciação particularizada, descabendo superlativar a análise abstrata da distância temporal do último ato ilícito imputado ao agente. O que deve ser avaliado é se o lapso temporal verificado neutraliza ou não, em determinado caso concreto, a plausibilidade concreta de reiteração delituosa” (HC n. 143.333, Relator o Ministro Edson Fachin, Plenário, julgado em 12.4.2018).
Cabe ressaltar, ainda, que a complexidade da apuração dos delitos pode levar ao decreto de prisão preventiva em momento razoavelmente posterior à pratica dos crimes sem que implique em ausência da contemporaneidade, sendo importante averiguar o momento em que os fatos foram levados ao conhecimento do juiz de piso para aferir esse requisito.
Outrossim, importante averiguar se prisão preventiva se sustenta nos indícios da prática de algum crime permanente, pois, se tal acontecer, impreterivelmente estará presente a contemporaneidade dos fatos.
A título de exemplo, fato que ocorre com frequência, uma investigação que apura a prática do crime de organização criminosa voltada para a prática de diversos outros crimes. Por se tratar de crime permanente, a prisão preventiva decretada em casos de organização criminosa sempre terá o requisito da contemporaneidade, ainda que os demais crimes em seu entorno não sejam de caráter permanente.
De forma semelhante, estando o autor foragido, tendo sido decretada a prisão para assegurar a aplicação da lei penal, o requisito da contemporaneidade estará presente enquanto não cessada a fuga, pois, conforme lição de Guilherme de Souza Nucci, em seu Código de Processo Penal Comentado – 7ª edição, Editora Revista dos Tribunais, neste caso a prisão: “significa garantir a finalidade útil do processo penal, que é proporcionar ao Estado o exercício do seu direito de punir, aplicando a sanção devida a quem é considerado autor da infração penal”.
Noutro norte, uma análise criteriosa dos requisitos contidos no artigo 315, § 1º, do Código de Processo Penal, sobretudo quando comparada com outros dispositivos do mesmo estatuto, deixa claro que a exigência da presença de fatos novos ou contemporâneos na decisão que impõe a constrição cautelar diz respeito tão somente às decisões que decretam a medida, não àquelas que apenas mantém a prisão, como, a título de exemplo, a decisão que revisa a preventiva no prazo de 90 dias e a que nega ao apenado o direito de recorrer em liberdade.
Para deixar bem clara a intenção do legislador, conveniente a leitura do artigo 316, parágrafo único, do Código de Processo Penal:
“Decretada a prisão preventiva, deverá o órgão emissor da decisão revisar a necessidade de sua manutenção a cada 90 (noventa) dias, mediante decisão fundamentada, de ofício, sob pena de tornar a prisão ilegal”
Indispensável comparar os textos dos artigos 315, § 1º e 316, parágrafo único, ambos do Código de Processo Penal. No primeiro (artigo 315, § 1º), que se refere às decisões que decretam a prisão preventiva ou outra cautelar, há a exigência expressa de que a fundamentação se dê em fatos novos ou contemporâneos. No segundo (artigo 316, parágrafo único), que é direcionado às decisões que analisarão a manutenção da preventiva, a única exigência é a fundamentação da decisão, não havendo qualquer menção de que essa fundamentação seja baseada em fatos novos ou contemporâneos.
Referido entendimento é corroborado pela redação do artigo 387, § 1º, do Código de Processo Penal, a qual não sofreu alteração do Pacote Anticrime e prevê, tão somente, que o magistrado, quando da prolação da sentença, decida, fundamentadamente, sobre a manutenção da prisão, não se exigindo que se aponte fotos novos ou contemporâneos:
“Art. 387. O juiz, ao proferir sentença condenatória:
[…]
§ 1º O juiz decidirá, fundamentadamente, sobre a manutenção ou, se for o caso, a imposição de prisão preventiva ou de outra medida cautelar, sem prejuízo do conhecimento de apelação que vier a ser interposta.”
2.4 Atraso na reavaliação da prisão preventiva e na realização da audiência de custódia: no que tange à necessidade de reavaliação da medida a cada 90 dias, conforme artigo 316, parágrafo único, acima transcrito, cabe destacar que a não observação da norma não implica, necessariamente, na revogação da prisão, visto haver o entendimento de que o prazo não é peremptório, conforme entendimento esposado pelo Min. Reynaldo Soares da Fonseca por ocasião do julgamento no STJ do HC nº 584992-SE: “não se trata de termo peremptório, isto é, eventual atraso na execução deste ato não implica automático reconhecimento da ilegalidade da prisão, tampouco a imediata colocação do custodiado cautelar em liberdade” (Publicado em 29.06.2020).
De igual forma, há certa tolerância dos julgadores no que concerne à não observância do prazo de 24 horas na realização da audiência de custódia (artigo 310, § 4º, CPP), sendo considerado mera irregularidade.
Sobre o tema, eis o escólio do e. Ministro Rogério Schietti Cruz:
“Poder-se-á objetar que a não invalidação da prisão preventiva decretada após esgotado o prazo de apresentação do preso (em flagrante) à autoridade judiciária competente iria de encontro à razão de ser da audiência de custódia e que, por conseguinte, esta se esvaziaria e perderia sua força normativa. O argumento é compreensível, visto que tudo há de ser feito em prol da consolidação desse mecanismo de controle da legalidade das prisões e em prol da mudança de cultura de todos os profissionais do Direito para que se efetive mais essa importante conquista civilizatória. Sem embargo, não se afigura racional e amparado no Direito anular o poder judicial de impingir medida cautelar ao imputado, em decorrência de eventual descumprimento de regra relativa ao que deve ocorrer anteriormente a decretação da prisão preventiva, sob pena de conferir-se uma espécie de salvo conduto a quem representa risco concreto à instrução criminal, a aplicação da lei penal ou à ordem pública. Vale dizer, a ilegalidade verificada logo no limiar da persecução penal produziria consequência sobre todos os atos subsequentes, eliminando a possibilidade de decretar-se a custódia, mesmo diante da presença de uma exigência cautelar” (In: Prisão Cautelar – dramas, princípios e alternativas. SCHIETTI, Rogério Cruz. 5° ed, 2020. Pg. 301).
Com relação à tolerância dos tribunais para a realização dos atos processuais, não se sabe se esse posicionamento foi forjado, ao menos em parte, pela pandemia da Covia-19.
2.5 Execução Provisória – Condenação Igual ou Superior a 15 anos: por fim, outra novidade implementada pela Lei n 13.964/2019 foi a execução provisória da pena quando a condenação for igual ou superior a 15 anos nos crimes de competência do Tribunal do Júri. Tal novidade encontra-se no artigo 492, I, “e”, do CPP:
Art. 492. Em seguida, o presidente proferirá sentença que:
I – no caso de condenação:
[…] e) mandará o acusado recolher-se ou recomendá-lo-á à prisão em que se encontra, se presentes os requisitos da prisão preventiva, ou, no caso de condenação a uma pena igual ou superior a 15 (quinze) anos de reclusão, determinará a execução provisória das penas, com expedição do mandado de prisão, se for o caso, sem prejuízo do conhecimento de recursos que vierem a ser interpostos;
Em um primeiro passo, deve ser salientado que, após o julgamento das Ações Declaratórias de Constitucionalidade nº 43, 44 e 54, pelo Supremo Tribunal Federal, sedimentou-se a impossibilidade de execução provisória da pena como decorrência automática da condenação, fazendo-se necessária a presença dos requisitos da prisão preventiva.
A polêmica trazida no bojo do artigo 492, I, “e”, do CPP, diz respeito à possível violação ao princípio da presunção de inocência e ao decreto de uma prisão preventiva sem a presença dos requisitos previstos nos artigos 312 a 315 do CPP.
Importante destacar que a constitucionalidade dessa norma está em discussão no Supremo Tribunal Federal, como tema da Repercussão Geral nº 1068, RE 1.235.340.
Afinal, tem-se apenas um requisito objetivo para fundamentar a prisão cautelar: a pena ser igual ou superior a 15 anos.
Por ora, a jurisprudência tem entendido “pela impossibilidade de execução provisória da pena, ainda que em condenação proferida pelo Tribunal do Júri com reprimenda igual ou superior a 15 anos de reclusão” (Precedentes: STJ, HC 649103/ES, Relator: Min. Antônio Saldanha Palheiro, 6ª Turma, julgado em 03.08.2021).
De fato, nos crimes de competência do Tribunal do Júri, tendo o réu respondido solto à ação penal, acredito que o decreto de prisão lastreado na regra prevista no artigo 492, I, “e” do CPP, necessita de uma fundamentação complementar para que seja referendado pelos tribunais.
Insta destacar, ainda, que a norma em análise possui natureza híbrida, tendo em vista que trata da restrição ou privação da liberdade, norma de natureza material, inserida em um diploma processual. Sendo mais gravosa, cabe ressaltar que não pode retroagir para prejudicar o réu nos casos ocorridos antes da vigência da nova lei.
3 Conclusão:
Ainda vai levar um tempo para que as alterações trazidas ao Código de Processo Penal pelo Pacote Anticrime sejam devidamente absorvidas pelos tribunais pátrios.
Parte do caminho seguido, até então, foi influenciado pela repentina e robusta mudança social ocasionada pela Covid-19. Com o fim da pandemia, a jurisprudência pode traçar novos percursos, sobretudo no que se refere ao reconhecimento de excesso de prazo, bem como de nulidades, diante da não realização de atos processuais ou de sua realização extemporânea.
Noutro norte, há questões polêmicas e de difícil entendimento, independente da pandemia, como a que está pendente de julgamento pelo STF, na Repercussão Geral nº 1.068, RE 1.235.340, citada anteriormente.
O desafio, como dito, é cristalizar a jurisprudência de forma a preservar, concomitantemente, tanto as garantias individuais quanto o interesse coletivo.
REFERÊNCIAS:
NUCCI, Guilherme de Souza, Código de Processo Penal Comentado, 7ª Edição – Editora Revista dos Tribunais.
SCHIETTI, Rogério da Cruz, Prisão Cautelar – Dramas – Princípios e Alternativas, 5ª Edição.