A AMMP transmitiu, hoje, o segundo e último dia do webinário “Tribunal do Júri”, abordando aspectos culturais, linguísticos e multidisciplinares do trabalho em plenário. O evento, que reafirmou o sucesso da Associação na produção de eventos remotos, foi aberto pela Promotora de Justiça e 2ª Diretora Financeira da AMMP, Júnia Barroso Oliveira Balsamão.
A primeira exposição do dia foi feita pelo Promotor de Justiça e coordenador do GAECO Varginha, Igor Serrano Silva, que falou sobre o “Júri envolvendo membro de Orcrim e tráfico ilícito de entorpecentes”.
Igor Serrano explicou que é preciso ser criterioso na identificação do investigado em interceptações telefônicas e telemáticas para não gerar absolvição. “É extremamente necessário dedicar uma parte da investigação para a identificação cabal do alvo. Não adianta o policial que está fazendo a interceptação ter a convicção de que a pessoa que está falando é o investigado. Você precisa fazer a prova disso. Já chegamos a nos deparar com a absolvição diante dessa dúvida. Não é raro.”
A transmissão prosseguiu com a palestra “Segredos da Sala Secreta”, proferida pelo Promotor de Justiça no Estado de Goiás, mestre em Ciências Criminais pela Faculdade de Direito de Lisboa e autor do livro “Persuasão na Tribuna”, Dany Salles Silva.
O renomado tribuno ressaltou, que para além da técnica jurídica, é preciso entender o contexto social e cultural da sociedade em que o júri está inserido para então utilizar a linguagem adequada. “A linguagem é o ponto de partida para que nós possamos imergir nos pontos mais intrincados correspondentes aos segredos da sala secreta. Pela linguagem os oradores dirigem a atenção dos jurados para um setor selecionado da realidade. Canalizando-os para o conjunto de associações mentais que sejam favoráveis às suas conclusões. A linguagem é um instrumento dinâmico, que circunscreve os juízes leigos a um círculo que só é possível entrar ou sair passando pelo círculo dos oradores. Nós somos as lentes pelas quais os jurados interpretam o caso concreto.”
Posteriormente, falou aos microfones do webinário, a Promotora de Justiça do MPMG Ana Cláudia Lopes, que abordou “Debates, primeira fala, apartes e réplica: uma abordagem prática”.
Cláudia Lopes apontou que os jurados têm em si a reflexão do que não é justo. “Não existe um conceito científico do que seja justiça, mas todo mundo tem um conceito do que não é justo. O júri serve para o Promotor demonstrar para os jurados o que não é justo. Que aquela conduta, aquele ato praticado não é justo. O Promotor no júri tem o papel de defender a vida, é quando ele está mais próximo da sociedade.”

O Feminicídio também foi abordado no evento. O Promotor de Justiça do MPMG Felipe Amantéa apontou o crime contra a mulher como um dos mais difíceis de serem debatidos no tribunal. “(…) Os júris de tentativa de feminicídio são os mais complicados porque o jurado tem que avaliar, não só se aquilo aconteceu, mas, principalmente, se a punição é necessária tendo em vista que a própria vítima perdoou o acusado. É preciso fazer um trabalho forte da contextualização da violência contra a mulher no Brasil e no mundo. A única saída que temos em um caso como esse é que consigamos convencer os jurados que a punição é necessária mesmo que a vítima não a queira.”
Por sua vez, o Promotor de Justiça do MPMG Adriano Dutra discutiu a “Quesitação nos crimes com concurso de pessoas”.
Na visão de Dutra, o garantismo tem preterido o direito à vida, o que exige cuidados na quesitação. “Vou utilizar o termo usado por César Danilo, que ontem falou sobre a necro-hermenêutica, que gostei bastante. Os necro-hermeneutas interpretam os dispositivos legais, interpretam as lições doutrinárias, interpretam as provas dos autos, via de rega, contra a vida e a favor da liberdade. É importante que tenhamos cuidado para tratar da quesitação, principalmente em crimes que envolvem o concurso de pessoas para que nós possamos nos prevenir dessa pandemia garantista.”
Já a Promotora de Justiça do MPMG Luciana Resende traçou panorama sobre a presença das mulheres no júri com a palestra “Mulheres na acusação: uma visão prática”.
Experiente, a Promotora criticou a estratégia de ataques de gênero. “Estou no MP há 19 anos e atuo no Tribunal do Júri desde a minha primeira comarca. O que a gente verifica é que vivemos em uma sociedade machista. A principal arma do advogado, quando tem uma Promotora de Justiça no plenário, é de desconstruir a sua credibilidade e diminuir sua capacidade. São ataques de caráter no sentido de atingir no aspecto de sexo feminino, buscando seu descontrole emocional. Isso é muito comum. Esse ataque tem que ser rebatido logo. Não podemos dar espaço para esse tipo de argumentação.”
O evento foi fechado com a palestra “Reflexões de um Promotor do Júri: uma abordagem multidisciplinar” ministrada pelo Promotor de Justiça do MPMG Vinicius Alcantara Galvão.
O Promotor de Justiça disse que no Brasil as leis não têm sentido positivo e carecem de valoração em plenário. “Por isso, muitas vezes, o membro do Ministério Público, além de provar a correlação dos fatos e a imputação, tem que valorar a lei. Na explicação sociológica, vamos ver que o cidadão do Brasil colônia, quando se deparava com a autoridade do governo, via um cobrador de impostos ou alguém que dificultaria suas relações comerciais. Grande parte das relações ocorreram no plano dos costumes. O brasileiro não é pacífico. É violento e aceita formas de composição social delineadas pela violência. Quando se trata de tentativa de homicídio, a primeira indagação que o cidadão faz é a seguinte: mas foi só uma tentativa?”
Os que não puderam acompanhar o webinário ao vivo, poderão assistir a todas as palestras na plataforma de cursos da AMMP. Haverá emissão de certificado para quem assistir a, no mínimo, 80% do conteúdo total.