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Curso sobre tribunal do Júri engrandeceu uma das funções mais nobres do MP

Nos dias 11 e 12 de abril, a AMMP realizou o curso, “Tribunal do Júri: função primordial do MP”, na sede. Durante os dois dias, cerca de 90 pessoas foram agraciadas com palestras de colegas do MPMG e convidados de áreas de atuação que são relevantes para o júri.
Para iniciar o curso, o presidente da AMMP, Enéias Xavier Gomes, em posse da palavra, realizou saudação ao Procurador de Justiça, Joaquim Cabral Netto, um dos mais importantes tribunos do Júri no estado. “Nossa atuação no Tribunal do Júri, lamentavelmente não tem despertado tanto interesse dos membros, ao passo que é nossa função primordial. Quando fomos preparar o curso, precisei escolher alguém para fazer a saudação. E eu não tive nem dúvida. Escolhi o Dr. Joaquim Cabral por toda história que tem no MP. ”
Em seu discurso, o Procurador de Justiça exaltou a importância do Júri para a sociedade. “Quem nos conhece, não são aqueles que militam nas varas cíveis, nas varas tributárias. Quem nos conhece são aqueles que, frente a frente, tem de falar diante dos homens e mulheres que defendem o interesse público, a paz social, a convivência e a certeza de que estes homens e mulheres estarão durante toda sua vida lutando para fazer justiça. ”
Para Cabral, os Promotores (as), buscam não apenas uma condenação, mas a verdade. “Qual foi o espanto aqui em BH, quando eu levantei a tese de que o réu merecia ser absolvido. Foi a primeira vez que um Promotor pedia uma absolvição. Mas é essa a nossa missão. Ser inflexível com a verdade, pedir aquilo que a consciência manda, sem jamais se desviar da prova do processo. ”

Danni Sales Silva aponta características do Júri que vão além da letra fria da Lei

A primeira exposição do ciclo de palestras foi comandada pelo Promotor de Justiça de Goiás, Danni Sales Silva, tribuno do Júri e autor do livro “Júri – Persuasão na Tribuna”. Em sua explanação apontou que os aspectos culturais e sociológicos do Tribunal do Júri são tão importantes quanto a legislação. Danni Sales Silva foi apresentado pelo presidente da mesa, o Promotor de Justiça Marcelo Schirmer Albuquerque.
O Promotor de Justiça iniciou sua fala para alertar aos presentes sobre os componentes que permeiam a decisão dos jurados. “O pano de fundo do julgamento nem sempre é o pano de fundo da nossa perspectiva. Nós temos um grande problema, a formação do Promotor hoje. Quando ele vai ser submetido à prova de tribuna, é indicar a materialidade e dar certeza da autoria. Autoria que antes era indiciária. Vencer essa temática não é o fundamental no Tribunal do Júri. É preciso persuadir. É preciso compreender o que se passa no mundo imagético dos jurados. ”
Na visão do tribuno, o Promotor deve ser capaz de se humanizar para conseguir tocar o jurado e isso significa entender o contexto o qual ele vive. “Um Tribuno do Júri deve conhecer todas as técnicas e dominar todas as teorias. Mas ao tocar uma alma humana, ele deve ser apenas uma alma humana. Se nós não formos sensíveis de que há fatores antropológicos que levam, que tendenciam a determinado veredicto, nós nunca vamos poder auxiliar o jurado a chegar no veredicto que conspira a favor dos valores societários”, analisou.

Perícia apresenta informações preponderantes para o Tribunal do Júri

Além de contar com profundos conhecedores da legislação e da atuação no Júri, em sua programação, o curso trouxe profissionais que atuam em áreas complementares. No primeiro dia de evento, o perito da Polícia Civil João Bosco Silvino Júnior mostrou aspectos importantes em cenas de crimes cometidos por arma de fogo. Quem presidiu a mesa da palestra foi a Promotora de Justiça Marília Carvalho Bernardes.
Na sua exposição, o perito dissecou a cena de crimes e explicou que o cenário é composto por elementos materiais e pessoas e que os indivíduos, assim como os objetos devem ser preservados. “Na Polícia Civel temos um profissional treinado para lidar com as provas materiais. Vão fazer o levantamento da prova objetiva. Já os investigadores são treinados para fazer o levantamento das provas subjetivas, relacionadas aos sujeitos do crime. Em uma cena de crime que tenha uma testemunha, é preciso preservá-la também. Acontece de Deus e o mundo conversarem com a testemunha. Assim, ela que pode mudar a narrativa quando o investigador chegar na cena do crime. Isso pode mudar o depoimento e influenciar no Júri”, alertou.
Ainda que a perícia criminal tenha ganhado mais notoriedade nos últimos anos, o policial civil disse em entrevista ao AMMP Notícias que é preciso aprimorar a atividade para se alcançar a plena justiça. “Hoje, com os filmes e seriados de TV, a população começou a perceber a importância da perícia. E a maturidade do sistema de Justiça brasileiro está começando a permitir que os órgãos periciais possam começar a fazer um trabalho de excelência. Precisamos de ter uma autonomia maior, precisamos de uma destinação orçamentária maior, porque a perícia demanda equipamentos caros e de alto custo de manutenção. É notória a falta de peritos em Minas.”

Cláudio Maia de Barros aponta desigualdade no Júri

Para fechar o primeiro dia de curso, o Promotor de Justiça do MPMG e associado, Cláudio Maia de Barros, proferiu palestra sobre os reflexos da disparidade de armas no livre convencimento do Júri. A mesa foi presidida pelo Promotor de Justiça Thiago Ferraz de Oliveira.
O Promotor expôs que o Júri, “tem apresentado” mudanças que incidem no diferente tratamento em relação ao Ministério Público. Ele citou o julgamento envolvendo o assassinato da missionária Dorothy Stang. “Por exemplo, o Habeas Corpus 108527, do STF. Eu me deparei com uma decisão, que depois de uma condenação do mandante a 30 anos de reclusão, o STF concedeu habeas corpus, ao singelo argumento, de que o defensor, e abre aspas, confessou que só teve tempo de ler quatro dos 26 volumes do processo. E com isso, três anos depois de um julgamento que se arrastava por anos, foi anulado para que a outro julgamento fosse submetido. Será que um membro do MP chegaria lá, diante de uma absolvição, e diria: eu não tive tempo de ler 10 dos 26 volumes. Duvido. ”
O tribuno disse notar mudanças profundas no Tribunal do Júri por experiência própria. “Venho percebendo, há anos, que há um tratamento em relação ao MP e aquele que recebe um instrumento particular para defender o interesse individual. A preocupação diz respeito à essência do Júri. Diz respeito ao material probatório que nós queremos levar ao conhecimento do jurado e que ele tem recebido de forma precária ou tolhida, quer pela legislação, quer pela interpretação que o intérprete dá para esta legislação.”

Tribunais do Júri não são imunes à loucura

“A loucura nos Tribunais”, com este tema, um dos maiores psiquiatras forenses do Brasil, Guido Palomba, abriu o segundo dia de curso. O especialista mostrou aos presentes, os contornos de conduta que definem os loucos. A mesa foi presidida pela Promotora de Justiça Júlia Baccarini de Castro e Silva.
“Como identificar um louco? ”. Embora Guido Palomba trate de um tema muito complexo, a resposta, para a questão, que ele mesmo levantou durante a palestra, é fácil. “É muito simples. Existe o critério da compreensão. E da incompreensão. A compreensão por exemplo: eu estou sem dinheiro, mato a pessoa e pego a carteira. Alguém vai me delatar, mato para queimar arquivo. Tudo isso é compreensível do ponto de vista psicológico. Mesmo que moralmente e judicialmente seja condenável. Existe alguma compreensibilidade em um indivíduo, estudante de medicina, que pega uma metralhadora, entra no cinema e mata pessoas que nunca viu? Dispara a esmo, é pego com a arma carregada e não oferece nenhum tipo de reação, não reivindica nada? É possível compreender psicologicamente isso, ou precisamos de uma pitada de psicopatologia? Quando não há compreensibilidade psicológica, provavelmente o crime foi praticado por um louco”, disse.
Palomba, que atuou como médico-chefe do antigo Manicômio Judiciário de São Paulo, entre 1975 e 1985, e que é perito habilitado nos Tribunais Judiciários de São Paulo desde a década de 70, destacou que o comportamento dos loucos é altamente observável. “A loucura é absolutamente real para o louco. A loucura verdadeira é insimulável. A morfologia do crime é tudo. Todos os crimes, sem exceção, são fotografias exatas e em cores do comportamento do indivíduo. “

Medicina legal é decisiva para o Promotor do Júri

Depois de aulas sobre a perícia e a psiquiatria forense, o médico legista da Polícia Civil, Marcelo Mari de Castro, analisou detalhes presentes nos laudos. A Promotora de Justiça, Ana Cláudia Lopes presidiu a mesa.
O médico formado pela Fundação Educacional Serra dos Órgãos, mestre na cadeira de Criminologia pela Escola Superior de Justiça de Buenos Aires e médico legista da Polícia Civil de Minas Gerais desde 2007, Marcelo Mari de Castro apontou em sua exposição aspectos técnicos de contusões, causas de mortes, instrumentos utilizados em crimes e descrição do laudo.
O médico destacou que os detalhes apresentados pelos laudos podem influenciar diretamente no Tribunal do Júri. “Saber descrever a ferida, dentro do laudo é de extrema importância para que o Promotor possa entender o mecanismo de ação, o instrumento que transferiu energia. Nessa parte de descrição, que é uma das principais partes do documento, chamado de relatório, é fundamental descrever de forma minuciosa, e colocando inclusive, fotos para poder ilustrar o que foi descrito. Não tenho a menor dúvida da importância disso para a Promotoria.”
Além das questões envolvendo a perícia, Marcelo Mari de Castro também traçou um panorama da estrutura de medicina legal da Polícia Civil de Minas Gerais, que está sempre pronta para ajudar o Ministério Público. “Nos cobrimos o estado inteiro. Temos um Instituto Médico Legal em Belo Horizonte e vários PPIs, Posto de Polícia Integrada, onde o perito está junto com o legista. Também temos os elementos chamados PML, que é Posto Médico Legal, onde o legista trabalha sem a presença do perito. ”

PL Anticrime mantém característica inquisitorial

Para o Procurador Regional da República, Vladimir Barros Aras, a proposta de lei é uma reforma setorial que não irá resolver problemas antigos. A Promotora de Justiça Giselle Luciane de Oliveira Lopes Viveiros Melo presidiu a mesa.
Um dos pontos analisados por Vladimir Barros Aras, em relação ao histórico de mudanças legislativas, é a incapacidade de o Brasil migrar do modelo inquisitivo para o modelo acusatório. “O PL Anticrime tem algumas particularidades importantes e refletem a necessidade de nós buscarmos uma compreensão de sucessivas reformas pelas quais o nosso Processo Penal passa e vem passando e que têm sido em vão. E mesmo aquilo que inova nas reformas que atingiram o Júri, essas reformas trouxeram mais problemas do que soluções. No que diz respeito à nossa cultura, aponto a incapacidade de transitar do modelo inquisitivo para um modelo acusatório. De um processo penal de papel, para um processo oral. E quando se trata de cuidar do Júri, compreendemos a importância da oralidade no plenário. Infelizmente quando nós voltamos os olhares para o procedimento ordinário, sumário, não encontramos esta mesma paixão pela oralidade.”
O Procurador Regional da República acredita que o ideal seria a criação de um novo Código de Processo Penal. “Minha crítica aos projetos, já diz algo sobre o cenário em que ele se insere, é que nós deveríamos ter sim um novo CPP que pudesse introduzir alterações no Júri que fossem relevantes para aqueles que militam nesse tipo de procedimento e para as vítimas. As vítimas não são normalmente lembradas por nossa jurisprudência, apenas por poucos setores da doutrina”, ressaltou.

A construção conjunta dos quesitos evita nulidades

O Desembargador do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, Carlos Henrique Perpétuo Braga abordou os quesitos e nulidades na cultural jurídica brasileira. O Promotor de Justiça Paulo Roberto Santos Romero presidiu os trabalhos.
Sobre o tema, o Desembargador apontou que o Brasil fundiu o modelo americano e o francês para criar um sistema brasileiro na elaboração dos quesitos e na votação do conselho de sentença. “Lembramos rapidamente do sistema americano, que nos influenciou em partes, e do sistema francês, que nos influenciou em partes, mas nós criamos um sistema tupiniquim. Elaboramos os quesitos na forma do sistema francês, mas fazemos uma pergunta, que lembra o sistema americano, só que com outra conotação: o jurado absolve o réu? Um detalhe, que sempre me preocupou é que na primeira e na segunda pergunta, você para condenar vai responder sim. E na terceira, o sim absolve. Se o jurado não estiver atento, se o promotor não for didático, se o juiz não for cauteloso, erra na solução do processo. O sim da materialidade, o sim da autoria e o sim da absolvição nós estamos liquidados. Porque será isso?”
Para minimizar erros e garantir a Justiça nos julgamentos, Carlos Henrique Perpétuo Braga, sugere que as partes construam a quesitação de maneira compartilhada. “Quando a gente fala no tribunal do Júri, existem dois momentos que são muito interessantes. Os momentos solos, só do juiz, só do promotor, só do advogado. E momentos compartilhados. A elaboração dos quesitos é um momento compartilhado. A construção dos quesitos, de forma conjunta, te dá mais segurança para evitar nulidades.”, explicou.

O poder do orador do Júri

Orador experiente, o Promotor de Justiça do Ministério Público de Minas Gerais Vinícius Alcântara Galvão traçou um paralelo entre o modelo de discurso e as características do Tribunal do Júri. O Promotor de Justiça Paulo Roberto Santos Romero presidiu a mesa.
Vinícius Alcântara Galvão remonta a filosofia grega e o desenvolvimento da retórica para apontar a importância da matéria para o Tribunal do Júri. “Quando se fala na retórica hoje, fala-se em um sentido pejorativo, como se fosse apenas um instrumento ornado, para que se pudesse fazer uma falsificação da realidade. Na verdade, a retórica era muito estimada pelos gregos. Os sofistas eram professores de retórica, eles ensinavam as pessoas nas técnicas, naquilo que chamavam de justificação persuasiva. Acho fundamental nós retomarmos esse conceito de retórica. Ela perdeu prestígio quando surgiu René Descartes. A partir do cartesianismo, foi como se tudo pudesse ser apurado a partir de um raciocínio matemático, e que a retórica não fosse mais necessária. A retórica foi alijada do Direito. No século XX, com Chaïm Perelman, e vários outros, se fala da nova retórica”, descreveu.
Ao participar do Júri, o membro do Ministério Público deve se ater à realidade presente, mesmo que ela não seja a desejada para a acusação, como aponta Vinícius. “O advogado procura um discurso mais incisivo, mais gestual, mais plástico nesse sentido, e as vezes se fala no Brasil, ganhou no grito. Não que eu esteja a concordar com isso. O auditório, a característica dele, é da forma que o é. Não da forma que gostaríamos que fosse e nem da forma que nós vamos supor ideologicamente que ele seja. ”

O jurado certo para o caso certo

A Promotora de Justiça Luciana Teixeira Rezende detalhou em sua palestra quais características dos jurados são ideias para julgamentos específicos. O Promotor de Justiça Paulo Roberto Santos Romero presidiu a mesa.

Ao iniciar sua explanação, a Promotora de Justiça fez um relato pessoal sobre o aprendizado que teve nos anos de atuação no Tribunal do Júri, principalmente o que aprendeu com os erros. “Na comarca de Bonfinópolis, era terrível porque o advogado de defesa conhecia a comarca inteira como a palma da mão. Quando os jurados chegavam, chamavam-no pelo apelido. Minha chance de sucesso era zero. Também fiz como nos ensinaram. Ao chegar a uma comarca desconhecida, pedi indicações para o oficial Justiça. Também não funcionou. A prova era clara como a luz e o réu foi absolvido. O segundo júri, a mesma coisa. O terceiro, a mesma coisa. Em João Pinheiro, uma cidade maior, o resultado era outro. Eu refleti, como a mesma atuação poderia ter resultados diferentes. Se estudei o processo, tive a mesma técnica, por que eu não tinha sucesso? Cheguei à conclusão é que temos que fazer uma pesquisa grande do perfil do jurado.”
Ela ainda apontou para os Promotores que as redes sociais são aliadas na hora de escolher as pessoas para compor o corpo de jurados. “No facebook as pessoas têm a necessidade de notoriedade. De publicar fotos e lugares que elas vão. Essa é uma boa fonte para nós. Também pesquisamos o Twitter e o currículo lattes para conseguir uma filtragem mais esmiuçada. ”

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